Na era da vitimização, não há grupos de vítimas tão grande ou reconhecidos como os das minorias raciais e de gênero.
Morando nos Estados Unidos, meu gênero (mulher) e etnia (latina) me colocam claramente no grupo de "minoria vitimizada". Eu não me vejo nesses termos. Mas o desejo comum de identificar e idealizar vítimas de minorias é tão grande, que alguns insistem em interagir comigo como membro de uma classe de vítimas. A intenção destas pessoas é boa. Mas a quem isso serve?
Embora a identificação de grupos menos favorecidos, e a identificação de preconceitos, seja necessária em busca da igualdade de oportunidades para todos os gêneros e raças, a politização deste assunto cria dois problemas importantes: a degeneração do discurso e (para mim, o maior problema de todos) a exaltação da subjetividade.
Com base em estatísticas, transformamos números em um mecanismo para obter poder para as minorias. Em outras palavras, tomamos resultados de pesquisas que (com suas limitações) são informações objetivas sobre demografias e os usamos para justificar a nossa percepção subjetiva da realidade, criando relações causais e vínculos onde não existem. Assim, dizemos: "Pesquisas apontam que o número de CEOs negros é infinitamente menor do que o de CEOs brancos. Eu acho que os brancos são racistas. Logo, o fato de não haver mais CEOs negros é culpa dos brancos". Ou dizemos: "Estudos demonstram que pouquíssimas mulheres atuam em carreiras na área de ciência e tecnologia. Eu acredito que todos os homens são gorilas estupradores do mal. Logo, o fato de haver poucas mulheres em carreiras de ciência e tecnologia é culpa dos homens". E assim, sem qualquer relação causal determinada pelas pesquisas e sem qualquer consistência, estas ideias evoluem.
Ao chegar a tais conclusões, o passo lógico seguinte é defender o fim das diferenças, claro! Que hajam mais mulheres em posições de CEO e em áreas de ciência e tecnologia! E, ao defender o fim das diferenças, partimos do principio de que existe uma uniformidade perfeita entre os grupos. Argumentamos que o grupo [INSIRA MINORIA] teria as mesmas oportunidades se não fosse pela interferência de [INSIRA MAIORIA OPRESSORA], porque somos todos perfeitamente capazes das mesmas coisas – e temos exatamente os mesmos interesses. Mas, se isso é verdade, porque a necessidade de diversidade? Se somos todos iguais, somos todos dispensáveis. Ninguém faz diferença, já que somos um grupo 100% uniforme de pessoas.
Entende como os dois conceitos não têm como habitar a mesma realidade? Ou somos todos diferentes (e, portanto, precisamos de uma boa combinação para capitalizar qualidades únicas e possuir um grupo heterogêneo qualificado), ou somos todos iguais (e cada ser humano possui as mesmas habilidades no mesmo grau de competência que qualquer outro ser humano, o que nos torna – em nossa individualidade – completamente dispensáveis e substituíveis).
Se reconhecemos a diversidade, temos que reconhecer também a falta de uniformidade. E se reconhecemos a falta de uniformidade, temos que reconhecer que nossas habilidades são diferentes. E aí, como podemos esperar e desejar que todos sejam tratados iguais se, na verdade, somos todos diferentes? Agora, se a briga é por uma oferta de oportunidades iguais a todas as pessoas em suas diferentes aptidões, interesses e habilidades, faz mais sentido. Neste caso, porém, o problema é outro: para oferecermos exatamente as mesmas oportunidades a todo o leque de aptidões e interesses diversos existentes em nossa sociedade, é preciso que haja uma oferta uniforme de oportunidades para todas estas diferenças. E para haver oferta tem que haver demanda. Neste caso, não há utilização de todo o leque de recursos disponíveis porque não há demanda, não por preconceito.
Nosso erro estaria então no fato de que nossos preconceitos nos fazem valorizar algumas habilidades mais do que outras, de onde não podemos tirar a conclusão simplista de que se somos menos qualificados nas áreas mais valorizadas pela sociedade, somos consequentemente pessoas menos valiosas.
Não se trata de sermos todos iguais e sim de termos oportunidades sociais e profissionais para todo tipo de habilidade.
No entanto, foi a posição de James Damore que fez com que ele perdesse o emprego. Ele era engenheiro do Google e foi demitido em agosto de 2017 depois de publicar em um grupo de mensagens que as mulheres não estão tão presentes na área de tecnologia porque (em geral) elas não estão biologicamente equipadas para a engenharia, nem têm o mesmo interesse. Ele não disse que as mulheres eram inferiores aos homens, ele disse simplesmente que elas eram diferentes. Ele está errado? Não! Eu sou diferente dos homens. Aliás, amo minha condição de mulher e não faço a menor questão de ser como eles! Não me considero melhor nem pior, mas deliciosamente diferente.
O problema é que o discurso dele foi politicamente incorreto. “É feio” dizer publicamente que existem diferenças inerentes a grupos. E para evitar marketing negativo, o Google tomou a decisão mais fácil: demiti-lo. O que é triste, porque tal atitude incentiva mais a homogeneidade do que a diversidade. E passa a mensagem subliminar para as mulheres de que elas devem se valorizar em comparação aos homens, como seus iguais, não por seus valores e habilidades intrínsecos.
Este é um movimento geral na sociedade. Reunimos grupos identificados como marginalizados para medir seu valor com base em quão idênticos são às maiorias ou aos grupos considerados (injustamente) livres de marginalização. Os famosos privilegiados. Agora igualdade e uniformidade se tornaram uma coisa só.
Da mesma forma, a responsável por diversidade da Apple perdeu seu emprego (uma mulher negra e talentosa) porque ousou sugerir que um grupo de homens brancos podem ser diferentes entre si. Ela abordou a diversidade como sendo parte da experiência humana, algo que extrapola gênero, raça e composição biológica. E foi criticada exatamente por isso. Ser branco hoje em dia é tão empoderador desde um ponto de vista social que anula completamente todos os outros aspectos da existência de uma pessoa: sua nacionalidade, sua sexualidade, os seus conhecimentos socioeconômicos, o seu passado religioso, seus fundamentos filosóficos, absolutamente tudo.
À subjetividade foi dada tal supremacia, que as posições populares sobre gênero e raça se tornaram meras construções sociais que não têm base em biologia ou ciência. Portanto, dizem, não devemos dar valor a isso. No entanto, devemos ter uma diversidade de raça e gênero perfeitamente uniforme em todas as posições profissionais mais desejáveis, porque raça e gênero são variáveis importantes nessas equações. Isso porque, justificam, pessoas de diferentes raças e gêneros trazem diferentes experiências e perspectivas para a mesa. No entanto, nunca devemos falar sobre o fato de que pessoas diferentes possuem diferentes inclinações e que isso molda quem elas são. Se o fizermos, dirão que isso se deve ao fato de sermos parte do grupo privilegiado de homens e brancos. Vê quanta contradição?
Agora, por que isso tudo é importante?
Porque há problemas reais no mundo, que precisam de soluções reais. Por exemplo, as taxas de encarceramento entre os negros nas sociedades ocidentais são altíssimas. As mulheres estão sub-representadas em empregos bem remunerados (o que não é o mesmo que dizer que há uma diferença de remuneração entre homens e mulheres). Os homens estão sobre-representados em empregos onde há maior risco de vida. As taxas de estupro são alarmantes. Problemas de saúde mental tiram muitas vidas a cada ano - especialmente dos homens. E estes são apenas alguns dos problemas que enfrentamos.
Qualquer bom cientista sabe que para mudar um resultado devemos primeiro diagnosticar sua causa com precisão. Se não identificarmos a causa correta, não reverteremos o resultado negativo. Por isso o problema em tornar tais questões objetivo de discussão política: quando as politizamos, as pessoas param de procurar respostas e começam a procurar bodes expiatórios. Deixa de ser uma questão de encontrar soluções e torna-se uma missão para encontrar culpados. Enquanto isso, o mundo sofre com as consequências reais desses problemas.
Pode ser que, após investigação minuciosa, revele-se que homens e brancos são responsáveis por 90% dos problemas do mundo. Mas atualmente não temos provas, apenas sentimentos criados pela nossa experiência subjetiva da realidade. Portanto, é necessária uma investigação minuciosa antes de condenarmos rapidamente grupos inteiros de pessoas.
Este não é um jogo onde os negros ganham e os brancos perdem, ou as mulheres ganham e os homens perdem. É uma realidade onde todos ganhamos ou perdemos juntos, porque há apenas uma Terra e todos temos que compartilhá-la.
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