Na minha prática, vejo muitas pessoas que sempre mudam de relacionamento sem mudar de parceiro. Seu novo parceiro pode ter um novo nome, um novo rosto, ser de uma cultura diferente, mas quando se trata do relacionamento em si, eles são exatamente iguais a todos os parceiros dos relacionamentos anteriores que, por algum motivo, não deram certo. Quando isso acontece, identificamos o que chamamos de padrão repetitivo de relações disfuncionais, o que é bastante óbvio para o observador externo, mas pode levar tempo para ser notado pelo cliente. Até aquele momento, sempre que um relacionamento termina e um novo começa, o cliente está convencido de que com essa nova pessoa as coisas serão diferentes, porque eles não cometerão os mesmos erros e o resultado final será outro. No entanto, quase nunca o é. E quando se torna óbvio para o cliente o quão destrutivo são os seus padrões de relacionamento, ainda pode levar algum tempo para que eles consigam se recusar a entrar em um novo relacionamento com o mesmo padrão ou para que abandonem o relacionamento atual, independentemente de quão tóxicos sejam. Por que será?
Poucas coisas na vida estão tão relacionadas à nossa criação e educação como os relacionamentos que estabelecemos como adultos. É o tipo de relacionamento que estabelecemos com nossos cuidadores primários que determinará como nos relacionaremos com futuros parceiros. Por exemplo, fomos atendidos quando éramos pequenos e manifestávamos uma necessidade? Sentimos que podíamos contar com nossos pais quando precisávamos deles? Sentimos que eles estavam sempre lá pela gente? Nos sentíamos seguros e protegidos ao seu lado? Sentimos, em algum momento, que éramos amados por eles somente quando exibíamos certos tipos de comportamentos ou traços de personalidade? Em outras palavras, que tipo de conexão estabelecemos com eles?
Através do exemplo, também serão eles que nos mostrarão como os relacionamentos devem funcionar: aprenderemos como tratar uma mulher ao ver o nosso pai tratar a nossa mãe, o que será exemplo tanto do que fazer como do que não fazer. Essa relação nos mostrará, também, que tão importante são as nossas opiniões, pensamentos e necessidades e, portanto, nos dirá quanto devemos esperar ser estimados pelos outros. Nossa relação com nossos cuidadores primários determinará, ainda, o que ofereceremos nos relacionamentos e o que esperaremos receber dos outros – o que, consequentemente, determinará nossas inseguranças e tudo que estiver relacionado a isso (que tão ciumentos ou possessivos seremos, por exemplo, qual é o nosso lugar em qualquer relacionamento, que tipo de ações precisamos dos outros para nos sentirmos amados e quais recursos usaremos para demonstrar amor). Sempre trazemos conosco para cada relacionamento que começamos um pacote abrangente de desejos e necessidades, e este (juntamente com as necessidades e desejos de nosso parceiro) poderá ser determinante para o sucesso ou fracasso da relação.
Agora, consideremos que todas as partes envolvidas trazem sua própria bagagem para uma nova relação. Isso significa que será preciso combinar desejos e necessidades, e ver como fazer para que funcione. O que não seria um problema, se tivéssemos sempre em mente que sempre há duas pessoas envolvidas em qualquer relacionamento. Mas, inconscientemente, o que geralmente acontece é que entramos em uma relação com uma ideia parcial de quem é a outra pessoa e uma ideia completa do que esperamos do outro. Com base nisso, construímos (inconscientemente) sobre a personalidade do outro (ou tentamos mudá-lo) para que atenda às nossas necessidades. Aqui é onde vem a ideia que diz que "o amor é um trabalho duro". Sim, é verdade, é sim. Mas deveria ser? A maioria de nós está constantemente tentando transformar a outra pessoa em algo que não é para que ela possa atender às nossas necessidades. Começamos a sair com alguém alegando estarmos apaixonados, mas quando o outro menos espera, estamos tentando fazer dele um Frankenstein, muitas vezes combinando coisas positivas de diferentes relações que tivemos no passado, somando as nossas expectativas à realidade do outro, que conhecemos apenas parcialmente. Com isso, ambos ficamos infelizes e, muitas vezes, nem conseguimos identificar quando foi que a lua de mel terminou.
Amar deveria ser equivalente a aceitar e não a tentar moldar. Nós somos quem somos (o que será bom para algumas pessoas e ruim para outras) e deveríamos estar com aqueles que precisam do que temos para oferecer. Quando tentamos moldar uns aos outros não estamos nos relacionamos verdadeiramente com a outra pessoa, mas sim com o nosso ideal e crença do que deveriam ser - o que é (no mínimo) injusto. Talvez isso contribua para a nossa ilusão de que através do outro podemos nos sentir completos? Pode ser, mas se há algo na gente que achamos que está faltando, deveríamos trabalhar nisso antes de tentar formar uma parceria amorosa, porque um relacionamento real é feito de duas pessoas completas, não de duas metades. Um esforço muito mais válido seria, então, olhar para si mesmo e perguntar: o que eu preciso em um relacionamento? O que eu tenho para oferecer ao outro? Essas necessidades são razoáveis e pertinentes a um relacionamento? Por que eu tenho essas necessidades e por que eu ofereço isso aos meus parceiros?
No entanto, quase nunca nos fazemos essas perguntas. Por que será? Porque, para isso, teremos que investigar questões mais profundas relacionadas à aquelas relações primárias, que nos serviram como modelos e que criaram os padrões que atualmente repetimos – o que não é fácil, é doloroso e exige um olhar crítico sobre a nossa criação e sobre o comportamento de nossos pais (ou cuidadores primários). Isso envolve questionar seu comportamento em relação a gente, seu amor (ou falta dele), a forma como fomos criados, e o que tudo isso significou para a gente. Por mais complicado que seja, este é o único caminho para promover mudanças verdadeiras e duradouras na gente, em nossas personalidades e, consequentemente, em nossos relacionamentos. Mas sem pensamento crítico, talvez um pouco de luto e até mesmo sem a remoção das nossas figuras parentais do pedestal onde geralmente os colocamos, isso dificilmente acontecerá.
Vale esclarecer que nenhum desses comportamentos está em nosso campo de ação consciente, pelo menos não na grande maioria das vezes. E é por isso que estou escrevendo sobre este assunto. A grande maioria das pessoas passa toda uma vida sem saber disso e muitas, mesmo após se tornar consciente dos seus padrões, ainda preferem evitar lidar com essas questões mais profundas, ao invés de enfrentá-las e se preparar para um relacionamento saudável e feliz. Muitas preferem atribuir seus insucessos a carma, destino, sorte ou em qualquer outra coisa que remova qualquer responsabilidade ou poder de suas mãos. Elas decidem que não há nada que possam fazer, além de continuar tentando encontrar "a pessoa" que as ajudará a reescrever sua história. Só que essa pessoa é ela mesma. O processo de autoconsciência e autoconhecimento na área de relacionamentos é difícil, mas muito necessário e vale muito a pena! Além disso, temos que lembrar que a mesma matriz que carregamos do nosso relacionamento com nossos pais será levada ao relacionamento com nossos filhos. E qualquer coisa (boa ou ruim) que recebemos deles será transmitida à nossa prole, que passará para a sua, e assim sucessivamente. É isso que queremos?
Em algum momento, precisamos nos conhecer, nos curar e trabalhar na nossa autoaceitação para nos tornarmos um inteiro em lugar de atuarmos como se fôssemos frações à espera de ser completadas. Não o somos! Somos muito mais do que isso. Mas precisamos nos tornarmos conscientes e atravessar estas águas (às vezes turvas), porque mais adiante há um lago de águas cristalinas nos esperando. Só temos que arregaçar as mangas e encarar o trabalho.
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